sexta-feira, 26 de junho de 2015

Os famosos do bairro

    

 Os famosos do bairro



     Existe uma coisa engraçada de ser professor no mesmo bairro onde se vive. Você sai às ruas e logo é reconhecido, quase uma  celebridade. Vou ao mercado, alguém me dá um tchauzinho. Na pizzaria, vejo uns olhinhos brilhantes puxando a barra da saia da mãe para ela compartilhar a surpresa de ver quem eles estão vendo: a professora!
Às vezes, eles ficam tímidos e dão apenas um sorrisinho de lado. Outras, berram do outro lado da rua: Prôôô!!!
     Encontro meus alunos em todo lugar perto de casa. No ônibus, na igreja, na feira e até em festa de familiares sempre tem um que é  amigo do aniversariante. É um singelo reconhecimento e até gosto dessa pseudo fama. 
    Uma vez, um balconista  me olhou com tanto entusiasmo quando entrei no seu estabelecimento que eu achei que estivesse sendo paquerada. Não lembrava que aquele molecote arteiro, agora moço bonito e trabalhador, tinha passado por minha trajetória docente alguns anos antes. 
     A sensação  é que para as crianças  só existimos na escola. Então, quando eles nos veem em um lugar rotineiro como farmácia, açougue, papelaria é como se estivessem vendo alguém ilustre! A reação  geralmente é um misto de surpresa e alegria. 
     Entretanto,  nosso reinado de Revista Caras sofreu ameaças algum tempo atrás. Umas figurinhas do Jaraguá começaram a aparecer num célebre (e bizarro!) programa de humor da televisão. Roubaram a atenção dos moradores. Quem não se lembra do Zina, corintiano que ficou conhecido simplesmente por falar: Ronaldo? Como o público se encanta por esses personagens não sei explicar. Mas a rapidez  com que ficam populares é impressionante! Depois da aparição televisiva, até andou distribuindo autógrafos na feira de domingo. Em seguida,  surgiram a Mulher fruta pão e seu irmão Michael Jackson da Xurupita. 



  Também não havia nada de extraordinário na performance deles. No entanto, por um período determinado,  divertiram alguns telespectadores que talvez se identificassem com os "artistas" da vila que estavam na mídia.
      A qualidade da atração não vem ao caso. Mas era uma febre, principalmente entre os adolescentes. 
     Fato é que, quando as celebridades estavam no auge, num dia qualquer, eu entrei na padaria e lá estava o comentado Michael Jackson do Xurupita. Menos caracterizado do que o modo como se apresentava no quadro humorístico, usando um jeans casual e uma camiseta simples. Esperava na fila do pão como todo freguês. Olhou pra mim e sorriu. Eu sorri de volta. Ele puxou conversa:

     -- Você está me reconhecendo? Sabe quem sou eu? 

    Eu sabia quem ele era, não só da televisão, mas do bairro. A irmã dele tinha algum parentesco distante com alguém da família da minha avó paterna. Pensei:  lá vem a síndrome da fama repentina. Vai me dizer que é o Michael Jackson. 

      -- Sei, sim. -- respondi. 

      Ele completou:

    -- Fui seu aluno ali na igreja, na alfabetização de adultos. Está lembrada, professora? 

    Eu tinha dado aula num trabalho voluntário, na igreja que frequentava, muito tempo atrás. Eu deveria estar no primeiro ano da faculdade, em 2001. Os irmãos famosos foram nossos alunos no tempo do anonimato. E apesar de já terem se passado tantos anos, a turma toda ainda se lembrava de mim e das outras professoras e nos cumprimentava na rua com o mesmo brilho nos olhos que as crianças têm. 

        --Claro que me eu lembro! 

    Ficou todo feliz com minha recordação. E eu, admirada! Ele nem tocou no assunto do programa de tevê. 
      A humildade, às vezes, é surpreendente. 


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